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Os Lares de Idosos na “Mira de Fogo” da sociedade

Os Lares de Idosos na “Mira de Fogo” da sociedade. Será verdade? As notícias dos últimos dias são preocupantes. As críticas revelam-se acutilantes. Vários especialistas vieram à comunicação social denunciar e apontar o dedo aos “culpados” da real situação que se vive nos lares de idosos. Exigem medidas urgentes por parte do Estado. Mas quem são os “culpados”? Será o Estado? Serão os dirigentes das organizações sociais?

A verdade é que assistimos a um silêncio ensurdecedor por parte do poder político relativamente a esta questão. Com o aumento dos surtos, e com a 2.ª vaga de Covid-19 já prevista, iremos assistir novamente à contabilização de um número absurdo de mortes nos lares de idosos? Assistiremos a uma tragédia anunciada?

Os avisos chegam por parte de vários especialistas que dão a voz a apelos sentidos para impedir que voltemos a repetir os erros recentes. Identificam diversas falhas como a falta de regulamentação, de recursos humanos, de espaços para cumprir as regras de segurança. Demandam a criação de medidas concretas a serem adoptadas pelos lares de idosos. Exigem a intervenção da Segurança Social. E, entretanto, os Lares de Idosos estão na “mira de fogo” da sociedade.

Para Ricardo Mexia, presidente da Associação de Médicos de Saúde Pública, a intervenção da Segurança Social para prevenir o contágio do Covid-19 nos lares de idosos é urgente. É peremptório quando afirma que a Segurança Social “tem de fiscalizar, assegurar que todos têm as condições necessárias, que têm planos de contingência, que têm os recursos humanos necessários e, se surgir alguma situação, têm de saber o que fazer”.

O presidente da Associação Nacional de Gerontologia Social, Ricardo Pocinho, afirma que “os números são a prova daquilo que se vive hoje nos lares”. Refere que “em Março, os lares já estavam cansados, hoje estão absolutamente desfeitos”, acrescentando que se tem verificado “um baixar da guarda”. O facto de estar em permanente contacto com várias instituições, permite-lhe ter uma visão realista do que acontece dentro dos lares de idosos. Desta forma, afirma que “hoje não existe sequer um quarto de isolamento. Os utentes vão a uma consulta ao hospital e no regresso não podem fazer o isolamento profilático e sete ou 14 dias, porque o lar está a abarrotar outra vez.” Considera-se surpreendido pela desresponsabilização das organizações sociais relativamente à falta de recursos humanos. E, refere que o Estado deveria ter uma maior responsabilização no que concerne à fiscalização e gestão das mesmas.

Jorge Roque da Cunha, secretário-geral do Sindicato Independente dos Médicos é categórico ao asseverar que esta situação é “um verdadeiro barril de pólvora”. Remete para a questão dos lares ilegais para dar um exemplo práctico do “silêncio ensurdecedor” por parte do Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social na questão dos lares. Avança que este ministério “tem como função o licenciamento, a fiscalização, a supervisão dos lares, o próprio financiamento, mas em relação à pandemia tem-se mantido totalmente à margem, passando para a Saúde toda a responsabilidade”.

O presidente da Confederação das Instituições de Solidariedade, Lino Maia, é apologista de uma articulação entre Saúde, Segurança Social e instituições. Uma vez que a desarticulação é evidente, e declara que o sector social e solidário “fica um pouco ostracizado”.

Luís Menezes Leitão, bastonário da Ordem dos Advogados, acusa o poder político da falta de intervenção na questão. Defende a aprovação de um plano de emergência por parte da Tutela, com o intuito de evitar situações análogas à que se verificou em Reguengos de Monsaraz.

Já para ex-ministro da Saúde Adalberto Campos Fernandes, o momento é de agregar esforços, com a Saúde, Segurança Social e autarquias. Para o ex-ministro os lares de idosos “são locais de altíssimo risco e não vale a pena entrarmos num jogo de sombras. É preciso reconhecer o trabalho que foi bem feito no sector e que na maioria das instituições as coisas correm bem, mas basta ter três ou quatro com situações graves para haver um enorme impacto.” Defende o avanço de um programa de certificação das instituições residenciais de idosos. A criação de um selo de garantia em como estas estruturas residenciais tem as condições exigidas pela Direcção-Geral de Saúde. E afirma que “há uma história que em Portugal nos responsabiliza a todos. Não temos olhado para a população mais idosa com a atenção que merece. Houve melhorias, mas temos ainda um problema de lares ilegais, que funcionam sem estarem licenciados, lares que mesmo estando legais não cumprem regras, recursos médicos e de enfermagem insuficientes. É uma realidade que daqui a dois três meses não podemos dizer que não conhecíamos. A covid-19 pôs a nu a vulnerabilidade que existe no país”.

As reestruturações dos lares de idosos são prementes. Trata-se de uma questão de saúde pública. É de salientar que muitas instituições cientes das suas carências efectivas, têm feitos diversos investimentos em tecnologia, implementando sistemas que permitam melhorar os serviços prestados aos seus utentes. Não é possível adiar o futuro. É preciso pensar no presente e nas necessidades concretas destas estruturas.

Diariamente homens e mulheres dão o seu melhor nos lares de idosos, um trabalho nem sempre reconhecido, nem sempre valorizado. A pandemia expôs o melhor e o pior da nossa sociedade. Urge uma reavaliação do sistema. Urge uma reavaliação dos códigos de conduta. Urge uma reavaliação da nossa consciência colectiva.

As vozes elevam-se com o propósito de defender os mais velhos, para evitar uma nova calamidade. O confinamento foi justificado para proteger a população, principalmente os mais vulneráveis. Passados cinco meses depois de decretado o “Estado de Emergência”, e tendo em conta as vozes acutilantes que se fazem ouvir, verificamos que ainda há muito para fazer.

Iremos manter os Lares de Idosos na “mira de fogo” da sociedade”? Estará o Estado a cumprir uma das suas principais funções: a protecção do seu povo? Como deverá ser interpretado este silêncio?  E se uma nova tragédia acontecer, quem será responsabilizado? A culpa “morrerá solteira” uma vez mais?

Nota: este texto não foi escrito ao abrigo do Novo Acordo Ortográfico

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